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quarta-feira, 18 de novembro de 2015

MINISTRO PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄BA)

Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudência
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RECURSO ESPECIAL Nº 791.260 - RS (2005⁄0175166-1)
 
RELATOR:MINISTRO PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄BA)
RECORRENTE:AESCOM SUL LTDA
ADVOGADO:GILBERTO DEON CORRÊA JUNIOR E OUTRO(S)
ADVOGADA:PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA
RECORRIDO:DARIO BRANDÃO BESTETTI E OUTROS
ADVOGADO:GUILHERME PUCHALSKI TEIXEIRA E OUTRO(S)
 
RELATÓRIO
 
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄BA) (Relator):
 
Trata-se de recurso especial, interposto com fundamento nas alíneas e c do permissivo constitucional, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul assim ementado:
 
"AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUÍZO ARBITRAL. LEI 9.307⁄96. FACULDADE. INDISPONIBILIDADE DA JURISDIÇÃO PORCONVENÇÃO PARTICULAR. MONOPÓLIO ESTATAL DA JUSTIÇA. INDISPONIBILIDADE DE DIREITOS EGARANTIAS INDIVIDUAIS.
Não se discute, no caso dos autos, a constitucionalidade da Lei n.º 9.307⁄96, pois esta é, por força da jurisprudência do egrégio STF, sabidamente constitucional. A questão, no caso concreto, diz com a possibilidade de as partes disporem⁄renunciarem, adrede e abstratamente, por convenção contratual, de direitos e garantias individuais, de matriz constitucional, o que agride a consciência jurídica.
A jurisdição é monopólio do Estado e a arbitragem tem lugar quando, já estabelecido o litígio, as partes por ela optarem. A previsão contratual de privilégio da arbitragem para a solução de impasses relativos a contratos dependerá, sempre, de vontade livre das partes nas condições acima mencionadas, dado o caráter relativo e programático de tal disposição.
Inteligência do artigo 5º, inciso XXXV, da CF.
AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO." (fl. 492)
 
Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados.
Nas razões recursais, a recorrente aponta, além de divergência jurisprudencial, violação dos arts. 535 do CPC, e 1º, 4º, 6º e 7º da Lei 9.307⁄96. Afirma, em síntese, que: (a) "(...) a Câmara desacolheu os embargos, configurandoevidente negativa de vigência ao artigo 535, II, do CPC, uma vez que o dispositivo impõe ao Juiz ou Tribunal o dever de (...) suprir omissão" (fl. 527); (b) "desde o advento da Lei 9.307⁄96, as partes contratantes estão autorizadas a eleger a Arbitragem como foro para solução de controvérsias oriundas na vigência de determinado contrato" (fl. 520); (c) "(...) importante frisar que não há qualquer empecilho para que o cidadão possa optar por dirimir seus conflitos fora da arena judiciária. Não há em tal dispositivo constitucional, nenhuma vedação que possa levar o intérprete a concluir pela impossibilidade de qualquer pessoa resolver suas controvérsias por meio de sujeição à justiça privada" (fl. 523).
Contrarrazões às fls. 899 a 916.
É o relatório.
 
 
RECURSO ESPECIAL Nº 791.260 - RS (2005⁄0175166-1)
 
 
EMENTA
 
PROCESSUAL CIVIL. ARBITRAGEM. OBRIGATORIEDADE DA SOLUÇÃO DO LITÍGIO PELA VIA ARBITRAL, QUANDO EXISTENTE CLÁUSULA PREVIAMENTE AJUSTADA ENTRE AS PARTES NESTESENTIDO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 1º, 3º e 7º DA LEI 9.307⁄96. PRECEDENTES. PROVIMENTO NESTEPONTO. ALEGADA OFENSA AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIALPARCIALMENTE PROVIDO.
 
 
 
 
VOTO
 
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄BA) (Relator):
 
Passa-se à análise da pretensão recursal.
Inicialmente, não se verifica, na espécie, omissão, contradição ou ausência de fundamentação na apreciação das questões suscitadas. Como é sabido, não está o órgão julgador obrigado a se manifestar sobre todos osargumentos apontados pelas partes, a fim de expressar o seu convencimento.
O pronunciamento sobre o fato controvertido, a que está o magistrado obrigado, encontra-se objetivamente fixado nas razões do acórdão vergastado. De se ver que, sem embargo de assumir conclusão contrária àpretensão do recorrente, a manifestação do Tribunal a quo sobre questões de fato e de direito suficientes, per si, a fundamentar o resultado, exprimindo sentido geral e uniforme ao julgamento, afasta por completo a alegação de violação do artigo 535 do CPC.
No mérito, cinge-se a presente controvérsia à discussão acerca da obrigatoriedade e vinculação da arbitragem ajustada entre as partes, por meio de cláusula arbitral, como solução de conflito surgido entre as mesmas no curso da relação jurídica respectiva.
A despeito do compromisso firmado, entendeu o Tribunal de origem pela possibilidade de qualquer das partes recorrer ao Poder Judiciário, independentemente do ajuste prévio em que se tenha optado pela via da arbitragem como meio obrigatório de solução de eventuais conflitos, tendo em vista que:
 
"(...) a cláusula contratual que adrede e abstratamente determina a submissão da resolução de litígios contratuais à arbitragem jamais poderá ser interpretada como absoluta, senão como relativa e programática, sob pena de ferir-se o princípio hierárquico e constitucional do monopólio estatal da Jurisdição." (fl. 494)
 
Sem embargo dos fundamentos expostos, deve ser reformado o entendimento consignado no aresto recorrido, por destoar da orientação desta Corte Superior acerca da matéria.
Nesse sentido, conforme bem preceitua Marcos Vinícius Tenório da Costa Fernandes:
 
"(...) o acesso ao Poder Judiciário pelas partes contratantes que tenham optado pela via arbitral é plenamente garantido pela Lei de Arbitragem. Claro que este acesso não pode substituir a própria apreciação do conflito pela Corte de arbitragem, sob pena de violação ao pacta sunt servanda, às normas de direito processual que tratam da matéria e às próprias regras estabelecidas pela Lei nº 9.307⁄96. De qualquer forma, resta evidente o pleno controle jurisdicional estatal sobre o funcionamento das Cortes de arbitragem e das próprias decisões por elas proferidas. Daí por que o Supremo Tribunal Federal já ter selado a plena constitucionalidade da lei em questão, posição que é compartilhada neste estudo.
Lamentavelmente, ainda existe grande resistência por parte do Poder Judiciário em aceitar aconstitucionalidade da Lei de Arbitragem. Em geral, essa resistência é refletida em decisões judiciais queafastam a aplicação do compromisso arbitral (ou da cláusula arbitral) firmado entre as partes sob ofundamento de uma alegada violação à garantia da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário.
(...)
Esse equivocado entendimento deixou de observar que a Lei de Arbitragem ingressou em nosso ordenamento em momento posterior ao Decreto-lei nº 4.657⁄42 (Lei de Introdução ao Código Civil). Aliás, o próprio inciso VII do art. 267, bem como o inciso IX do art. 301, do Código de Processo Civil foram acrescentados em data posterior ao art. 88, inciso II, do mesmo diploma legal. Assim, observando-se o disposto no art. 2º, § 1º, doDecreto-lei nº 4.657⁄42, conclui-se pela prevalência dos dispositivos de lei favoráveis à validade e aplicação do compromisso arbitral firmado entre as partes (...).
O art. 267, inciso VII c⁄c art. 301, inciso IX, do Código de Processo Civil constituem exceções à regra geral do art. 88, inciso II do mesmo diploma legal. O entendimento em exame vai de encontro, também, ao art. 1º c⁄c art. 3º da Lei de Arbitragem. Com o ingresso da Lei nº 9.307⁄96 em nosso ordenamento jurídico, a apreciação e pacificação dos conflitos poderá - de acordo com a vontade das partes capazes de contratar e sempre que estejam em jogo direitos disponíveis - ficar ao encargo de um Tribunal Arbitral, afastando-se a apreciação da lide pelo Poder Judiciário." ("Anulação de Sentença Arbitral". São Paulo: Atlas, 2007, pp. 10-11, grifou-se)
 
 
A propósito, confiram-se os seguintes precedentes desta Corte:
 
"LEI DE ARBITRAGEM – INSTITUIÇÃO JUDICIAL DO COMPROMISSO ARBITRAL – OBJETO DO LITÍGIO –INFRINGÊNCIA A CLÁUSULAS CONTRATUAIS – VALIDADE – AUSÊNCIA DE OMISSÃO.
I – Se o acórdão recorrido aborda todas as questões submetidas à sua apreciação, não há falar em violação ao inciso II do artigo 535 do Código de Processo Civil.
II – Para a instauração do procedimento judicial de instituição da arbitragem (artigo 7º da Lei n.º 9.307⁄96), são indispensáveis a existência de cláusula compromissória e a resistência de uma das partes à sua instituição, requisitos presentes no caso concreto.
III – Tendo as partes validamente estatuído que as controvérsias decorrentes dos contratos de credenciamentoseriam dirimidas por meio do procedimento previsto na Lei de Arbitragem, a discussão sobre a infringência às suas cláusulas, bem como o direito a eventual indenização, são passíveis de solução pela via escolhida.
Com ressalvas quanto à terminologia, não conheço do recurso especial." (REsp 450.881⁄DF, TERCEIRA TURMA, Rel. Ministro CASTRO FILHO, DJ de 26⁄05⁄2003)
 
 
"Processual civil. Recurso especial. Cláusula arbitral. Lei de Arbitragem. Aplicação imediata. Extinção do processo sem julgamento de mérito.  Contrato internacional. Protocolo de Genebra de 1923.
Com a alteração do art. 267, VII, do CPC pela Lei de Arbitragem, a pactuação tanto do compromisso como da cláusula arbitral passou a ser considerada hipótese de extinção do processo sem julgamento do mérito.
- Impõe-se a extinção do processo sem julgamento do mérito se, quando invocada a existência de cláusula arbitral, já vigorava a Lei de Arbitragem, ainda que o contrato tenha sido celebrado em data anterior à sua vigência, pois, as normas processuais têm aplicação imediata.
- Pelo Protocolo de Genebra de 1923, subscrito pelo Brasil, a eleição de compromisso ou cláusula arbitral imprime às partes contratantes a obrigação de submeter eventuais conflitos à arbitragem, ficando afastada a solução judicial.
- Nos contratos internacionais, devem prevalecer os princípios gerais de direito internacional em detrimento da normatização específica de cada país, o que justifica a análise da cláusula arbitral sob a ótica do Protocolo de Genebra de 1923. Precedentes.
Recurso especial parcialmente conhecido e improvido." (REsp 712.566⁄RJ, TERCEIRA TURMA, Rel. MinistraNANCY ANDRIGHI, DJ de 05⁄09⁄2005, grifou-se)
 
"Processo civil e consumidor. Recurso especial. Contratos interligados para construção de navio. Previsão de cláusula arbitral. Obrigatoriedade da solução de conflitos por tal via, acarretando a extinção sem julgamento de mérito de ação de reparação por perdas e danos. Alegada relação de consumo a invalidar esse dispositivo. Suposta impossibilidade de aplicação da Lei nº 9.307⁄96 a contratos firmados antes de sua vigência. Alegação de violação ao art. 535 do CPC inexistente.
- Não se reconhece violação ao art. 535 do CPC quando ausentes omissão, contradição ou obscuridade no acórdão.
- Aplica-se a Lei nº 9.307⁄96 aos contratos constituídos antes da sua vigência se, nestes, há previsão de cláusula compromissória anteriormente regida pelo CC⁄16 e pelo CPC.
- Não se conhece de recurso especial quando ausente o prequestionamento da matéria, e também na parte em que este se encontra deficientemente fundamentado.
Recurso especial não conhecido." (REsp 653.733⁄SP, TERCEIRA TURMA, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJ de 30⁄10⁄2006, grifou-se)
 
Em virtude do exposto, deve ser parcialmente provido o recurso especial, tendo em vista a procedência do mérito recursal no sentido da configuração de ofensa aos arts. 1º, 4º, 6º, e 7º da Lei 9.307⁄96, caracterizada, por outro lado, a ausência de violação do art. 535 do CPC.

É como voto.

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